domingo, 29 de março de 2015

O furo na parede

Se lembra quando eu disse que, ao receber de Deus a cura de minha dependência em anfetaminas, não significava que Ele houvesse apagado o meu passado e nem me livrado das consequências de tudo o que fiz? Deus "tirou o prego", mas em sua soberana vontade, manteve a marca, o "furo na parede".

As consequências foram aparecendo, cada vez mais fortes conforme eu envelhecia. O meu organismo continuou debilitado, fraco, sem energia. Meu metabolismo foi seriamente atingido, tornando-se cada vez mais lento, dificultando a perda de peso. Mesmo assim, eu continuava lutando.

Desenvolvi o hipotireoidismo.

A tireoide é uma glândula importantíssima para o funcionamento harmônico do organismo. Os hormônios liberados por ela, T4 (tiroxina) e T3 (triiodotironina) estimulam o metabolismo. O hipotireoidismo é um distúrbio da tireoide que passa a ter nenhuma ou baixa produção de hormônios. Com essa disfunção passei a ter muito cansaço, depressão, adinamia (falta de iniciativa), pele seca e fria, diminuição da frequência cardíaca, decréscimo da atividade cerebral, inchaço, sonolência, reflexos mais vagarosos, intolerância ao frio, alterações menstruais e ganho de peso. Tive que começar um tratamento que duraria para o resto de minha vida.

Também me tornei uma pessoa hipoglicêmica.

A hipoglicemia é um distúrbio provocado pela baixa concentração de glicose no sangue. Os quadros de hipoglicemia se instalam quando aumenta a quantidade de insulina no sangue, quando diminui a quantidade de hormônios do crescimento, adrenalina e cortisol. Os sinais da hipoglicemia podem ser produzidos pelos hormônios de contrarregulação e pela redução de glicose no cérebro. No primeiro caso, os sintomas são tremores, tonturas, palidez, suor frio, nervosismo, palpitações, taquicardia, náuseas, vômitos e fome. No segundo, confusão menal, alterações do nível de consciência, perturbações visuais e de comportamento que podem ser confundidas com embriaguez, cansaço, fraqueza, sensação de desmaio e convulsões. No início me foi muito difícil aprender a controlá-la, mas com o tempo consegui entender os sinais dados pelo meu corpo. Não há medicamentos a serem tomados, é necessário prevenir as crises restringindo a ingestão de açúcares e se alimentando a cada 2 ou 3 horas.

Sempre tive dificuldade para dormir nos horários convencionais, isto é, enquanto todos dormiam eu ficava acordada e vice-versa. Tenho o chamado "cronotipo vespertino". Porém, depois de tudo o que me aconteceu, essa peculiaridade de minha vida se acentuou, passando a me prejudicar no dia-a-dia, no trabalho e nos estudos.

Minha dificuldade de concentração e de memorização também permaneceram e foram ficando maiores conforme o tempo foi passando. Foi com muita dificuldade que consegui concluir os meus 5 anos de faculdade. Só eu sei o quanto sofri para acordar cedo todos os dias, permanecer atenta às aulas, fazer as leituras de livros e mais livros, realizar trabalhos, fazer projetos, apresentar seminários... Não contava a todos sobre o meu "passado trágico", mas ao mesmo tempo me era extremamente difícil não ter como explicar minhas dificuldades sem tocar nesse assunto.

Fui à vários endocrinologistas nos anos seguintes, sempre buscando novas alternativas. Eu não desistiria de lutar contra o excesso de peso. De tempos em tempos tentava uma loucura, como a dieta da lua, a dieta do ovo, a dieta da sopa, dieta naturalista, dieta dos carboidratos... Fazia exercícios regularmente e vez ou outra tomava medicamentos "leves", sem nenhum composto que tivesse co-relação com anfetaminas. Apesar de entender que eu era bonita estando magra ou gorda, meu sonho em ter um corpo que não fosse notado de maneira negativa continuava permeando os meus pensamentos.

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